segunda-feira, 7 de abril de 2014

Retrato escrito

Cochilei no colo do meu amor e sonhei que estava dando banho na minha avó Margarida. E a casa toda foi cenário do meu sonho. O banheiro da banheira, com o piso avermelhado e se eu não estou enganada, um armário embutido à moda antiga lá dentro. A janela desse banheiro dava para o tanque que era pareado com a mesa de jantar da varanda e essa tinha a vista do quintal como um plus. Do quintal se via a antiga morada dos passarinhos do Tio Izidoro e lá tinha uma espécie de muretinha aonde eu lia meus livrinhos da escola vendo o pé de chuchu e para descansar os pensamentos pegava um raminho para fazer pulseirinha. E quando queria aventura era só atiçar os cachorros do vizinho que sempre me pareceram ser enormes, com dentes grandes e baba de raiva, mas até hoje eu nunca os vi. Só tinha medo que eles conseguissem pular o muro e me comessem viva. Mas eu saia correndo e ia me ralando toda pelo vão mais estreito que eu já vi de perto até chegar de algum jeito no jardim da frente, pular o muro sem cair pelas escadas e me dar conta que estava sã e salva no portão que dava pra rua. Tragédia mesmo era quando o portão estava trancado e tinha que pular o muro da rua sem ninguém perceber para entrar pela sapataria, pedir benção pro Tio Zé na maior cara dura e seguir para a entrada da cozinha como se nada tivesse acontecido.

Legal também era brincar de floresta no quintal dos fundos. Aquilo era um mato a ser desbravado. Achar joaninha e tirar as asinhas pra fazer corrida delas no tanque com água, encher o balde de jabuticaba tirada do pé e balançar o pé de coeté. Hum, me esqueci se é esse mesmo o nome da fruta, mas era uma bem pesada que sempre nos diziam que se caísse na cabeça matava. Não que quiséssemos que alguém morresse, mas a garotada sempre teve curiosidade para saber se dava pra deixar tonto.

E nada como ganhar no par ou ímpar para dormir no quarto da frente que dava pra rua! Poder olhar na fresta da janela e ver os primos mais velhos da casa da Tia Cica namorando não tinha preço. E quando tinha festa então! Ficávamos ali espiando tudo que rolava lá no mundo dos primos mais velhos.

Eu me lembro que quando chegávamos de madrugada de São Paulo, a chave estava escondida no vaso do alpendre. Entrávamos pelo quarto da frente, passávamos pela sala enorme, com o sofá grande embaixo do quadro da bisa e do biso e com as poltronas laterais, sem esquecer da TV de tubo e o relógio tic tac de pezinho que estavam sempre lá, na estante da sala. Íamos com pés de pano até o corredor. A intenção era não fazer o piso de madeira ranger para não acordar vovó.

A mesa da sala já estava sendo posta com o café da manhã pela Dinha. E aí todo mundo que estava por perto ia nos ver. Tomávamos café juntos e as tias colocavam a conversa em dia. Na hora do almoço era hora de ir pra cozinha, pegar panelas na dispensa, banha de porco pra esquentar e couve no quintal para fatiar bem fininho.

Pra terminar a festa, Tio Zé fazendo o cigarro de palha no alpendre e Tio Vivaldo cascando laranja sem ferir para a garotada toda marcam minha memória.

Lembranças que me fazer sorrir sem que ninguém que esteja a minha volta entenda nadinha de nada.

Tetê

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