sexta-feira, 1 de janeiro de 2016

desequilibrado

Muitas vezes eu escrevo, escrevo, escrevo e termino o texto, o conto, o artigo, ou seja lá que nome for o que eu tenha escrito e quando paro de escrever e acho que terminado está, pego uma palavra que mais representa o todo e lanço como míssel no campo título. E às vezes faço exatamente o oposto. É o caso de hoje. Sem que o todo esteja definido e sem ter ideia de onde isso tudo vai dar eu sei que o que quero é falar, fazer pensar, desabafar, construir alguma reflexão a respeito do equilíbrio que buscamos e do desequilíbrio que somos. Muitos sabem do meu orgulho de ter nascido e ter sido criada no interior de Minas. Nem tudo foi maravilhoso e coisa pacas deve ter sido ruim pra daná, mas eu me sinto feliz em dizer que sou do interior, em não ter nascido no centro do mundo e em poder arrastar erre com orgulho de quem conquistou o seu próprio mundo, mas nasceu em Itaúna. Pois bem, o interior tem coisas que gente importante nenhuma entenderia sem ter ouvido atentamente. E uma das coisas é ter parentesco, ou ser vizinho, ou ter falado bem ou mal algum dia na vida dos donos do comércio todo da cidade. Os que eu me lembro são a senhora da ótica, o fulano de tal da loja que consertava relógio, o outro fulano de tal da pastelaria da esquina da casa da minha avó, o Renato do Rena Supermercados, o ciclano da loja de aviamentos da cidade e a moça que todo mundo cumprimentava da loja de sapatos do centro, sem esquecer da Márcia da padaria. Os nomes não me vêem mais à mente, mas eu me lembro dos lugares, dos rostos e até da minha paixonite pelo moço da locadora de vídeo. E assim vamos indo pela prainha afora, pela praça adentro, pela avenida da casa da tia e pela rua da casa da vó. E antes de ir adiante ainda há tempo para se espantar com o fato da amiga da minha tia de um desses comércios estar na creche. O mal de (ai meu Deus, não sei como se escreve) Alzaimer fez com que a memória recente dela fosse pro beleléu, mas ela se lembra muito bem do passado. E a melhor amiga dela hoje tem cem anos. E ela vai todos os dias de van para a creche. Ela não tem netos. Ela não deixa ninguém menos do que ela própria por lá. Passa o dia, conversa, se entretém e volta pra casa e para os cuidados da filha no final do dia. Não estou certa se há muito desequilíbrio nessa rotina ou se está tudo equilibrado, sob controle, armazenadinho na gaveta certa. Não tenho certeza das escolhas que cada um dos personagens dessa série de TV fizeram e não sei muito bem o que se passa na cabeça esquecida da elegante jovem da creche. A rotina de cada um de nós não é nada além do que a rotina de cada um de nós. Nada complicado ou exótico porque rotina é rotina. E não há nada de muito especial em rotina nenhuma. O especial tende a ser aquilo que encanta a rotina, que surpreende o dia-a-dia e que nos dá alegria. Comprar um batom novo pode ser muito especial, comer uma comida gostosa também e dar um dedo de prosa ao doido da rua pode fazer um bem danado. Você é quem sabe o que é especial para você, e, se não souber busque se conhecer mais e melhor. Mais cedo ou mais tarde você vai precisar saber o que te faz bem e o que é especial pra se fazer mais feliz. E nunca se esqueça. Não se equilibre ao ponto de não sentir o frio na barriga quando o dia do desafio estiver se aproximando. Não se esconda atrás de você mesmo das dificuldades, dos problemas, das possibilidades de ofensas, dos insultos e julgamentos aos quais todos nós estamos sujeitos. O mais legal da creche é ser você mesmo e conviver com um monte de outras pessoas que vão te irritar, te amedrontar, te insultar, te alegrar, te fazer pensar e te desequilibrar por alguns instantes ou pela maior parte do tempo que você conseguir lembrar ao descansar os seus sonhos no final do dia.

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